*Por Luiz Fernando Alouche e Marianne Calil Jorge
No direito brasileiro, a regra geral é a aplicação do princípio da continuidade do vínculo de emprego, sendo, contudo, permitido ao empregador exercer o direito potestativo de rescindir o contrato de trabalho do empregado, sem justa causa, sem que exerça qualquer justificativa para tanto.
Todavia, em alguns casos, a legislação brasileira prevê o instituto da estabilidade provisória, por meio da qual o empregador tem limitações legais para exercer o seu direito potestativo para rescisão do vínculo de emprego.
A estabilidade provisória visa assegurar a dignidade da pessoa humana, como nos casos da estabilidade de empregados que sofreram acidente de trabalho, a proteção ao direito alimentar da mulher e do nascituro e a proteção contra os eventuais e necessários embates com o empregador, nos casos dos cipeiros e dirigentes sindicais.
Tamanha a importância da garantia ao emprego do dirigente sindical que a legislação previu uma peculiaridade: o legislador concedeu ao sindicalista o direito de ser ouvido antes da sua dispensa, em processo judicial próprio denominado como apuração de falta grave, o qual deve ser ajuizado perante a Justiça do Trabalho.
Embora as figuras do dirigente sindical e de dirigente de cooperativas sejam equiparadas, a discussão sobre a estabilidade de dirigente de cooperativa começa com a identificação da própria natureza jurídica da cooperativa, uma vez que no ordenamento jurídico vigente, existem duas espécies, são elas: as Cooperativas de Emprego e as denominadas Cooperativas de Trabalho.
Nos termos da Lei 5.764/1971, as Cooperativas de Emprego são compostas por pessoas, que se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro, enquanto que as Cooperativas de Trabalho são regidas pela Lei 12.960/2012 e se configuram pela união de profissionais autônomos com objetivo de potencializar ou incrementar os lucros, gerando, por consequência, maiores rendimentos pelo trabalho comum, o que dificilmente seria alcançado se cada um dos profissionais trabalhasse individualmente.
Diante da existência de duas espécies de Cooperativas, há recorrente discussão perante a Justiça do Trabalho sobre a possibilidade de reconhecimento de estabilidade provisória para os seus dirigentes de cooperativas – equiparando-os, portanto, aos dirigentes sindicais.
Apenas nas hipóteses das Cooperativas de Emprego, o empregado eleito para ser dirigente pode, de forma legitima e em nome dos demais empregados associados à Cooperativa, representá-los passiva e ativamente, o que gera a possibilidade de confronto direto com o empregador, razão pela qual se justifica o reconhecimento da estabilidade provisória.
Assim, a garantia de emprego dada a dirigentes sindicais das Cooperativas de Emprego decorre exatamente da necessidade de se proteger aqueles que possuem funções que se assemelham às praticadas pelos dirigentes sindicais.
A estabilidade provisória dos dirigentes de cooperativas também deve respeitar o limite máximo de sete dirigentes, acrescidos de sete suplentes, já que o Supremo Tribunal Federal entendeu pela recepção do artigo que prevê a mencionada limitação para o número de dirigentes e suplentes que detêm estabilidade provisória.
Quanto aos dirigentes de Cooperativas de Trabalho, ainda que o tema seja controverso, entende-se que não há estabilidade provisória, e, portanto, podem exercer atividades diversas das desenvolvidas pelo empregador, sem que haja qualquer interesse na representação de empregados. Exemplos comuns de Cooperativas de Trabalho são aquelas formadas para a comercialização de produtos eletrônicos, bebidas e imóveis.
Diante do imbróglio sobre a natureza jurídica da Cooperativa, tem-se notado que algumas delas são formalmente constituídas com nítida finalidade fraudulenta, na medida em que não visam a proteção e representação do empregado, tampouco a associação de cooperados para atingir lucros. Bem da verdade, muitas destas Cooperativas são criadas com o único objetivo de que o empregado atinja uma pretensa e inexistente estabilidade provisória no emprego.
Atentos às diferenças entre as naturezas das Cooperativas de Trabalho e de Emprego, alguns juízes do trabalho têm tido a cautela de aprofundar a temática com questionamentos sobre quais os objetivos, modo de funcionamento, forma de arrecadação e atuação dessas Cooperativas.
Isso é necessário porque a Justiça do Trabalho tem como um dos princípios basilares a primazia da realidade, sendo mais importante a demonstração do que ocorre de fato, ao revés do que está formalmente descrito em documentos.
Se restar demonstrado que a Cooperativa não tem como finalidade a proteção e representação dos empregados na proteção de direitos trabalhistas, os Tribunais Regionais do Trabalho têm entendido que os empregados que ocupam cargo de liderança nas Cooperativa não possuem direito a estabilidade provisória.
Diante de todo o acima exposto, em razão das diferenças apontadas entre as Cooperativas de Emprego e de Trabalho, conclui-se que apenas os dirigentes de Cooperativas de Emprego validamente constituídas possuem estabilidade provisória equiparadas aos dirigentes sindicais.
* * *
Luiz Fernando Alouche é sócio no Inglez, Werneck, Ramos, Cury e Françolin Advogados, especializado nas áreas de direito trabalhista e previdenciário, com ênfase nas áreas consultiva e contenciosa. Foi Presidente do Comitê Trabalhista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional de Pinheiros (2014-2017) e é membro do renomado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), além de Vice Presidente do Comitê de Gestão de Pessoas da Câmara Espanhola de Comércio (2011-2012). Luiz Alouche foi reconhecido por diversas vezes como uma das referências na área trabalhista (Análise 500 e Legal 500).
Marianne Calil Jorge, advogada da área trabalhista no Inglez, Werneck, Ramos, Cury e Françolin Advogados
0
Leave a Comment