*Por Cris Moraes
Com a tragédia das tempestades e enchentes no Rio Grande do Sul, a imprensa naturalmente cobre o acontecimento e as ações de empresas, doadores e voluntários. Muitas companhias estão transformando suas iniciativas de doação em pautas para divulgação. Mas até que ponto essa é a melhor estratégia? Será que todo assunto pode virar pauta na imprensa?
Uma das atribuições da área de relações públicas é cuidar da imagem das organizações e de sua identidade corporativa. Cabe a nós, profissionais da área, ajudar as empresas e entidades a desenvolverem suas imagens e transmitirem para o público as mensagens desejadas. Em momentos de dor e crise, é compreensível o desejo de divulgar as ações realizadas, passando a imagem de uma organização engajada em causas sociais e disposta a ajudar os mais necessitados, estimulando outras empresas a seguirem o mesmo caminho. No entanto, as coisas não são tão simples assim.
O primeiro ponto que devemos considerar é se as ações voltadas para o social e o ambiental fazem realmente parte da realidade e do DNA da companhia. Ela realiza ações desse tipo de maneira contínua? Se sim, há quanto tempo? Ou é apenas uma iniciativa pontual, como a doação de alimentos neste momento de emergência? O objetivo aqui não é levantar suspeitas ou considerar ações ocasionais como oportunistas, mas realmente avaliar se a organização carrega a consciência social como parte de sua rotina e funcionamento. Isso porque a divulgação de ações apenas neste momento pode trazer um efeito oposto ao desejado. Em vez de transmitir a imagem de uma companhia solidária, pode fazer com que o público se questione sobre a autenticidade da ação e gerar a pergunta: “Por que não fazia isso antes?”.
Antes de decidir se um assunto deverá ser divulgado ou não para os veículos de comunicação, devemos ser cautelosos para entender como essa informação será percebida pelo público. Com a frequente utilização das redes sociais, as pessoas se aproximaram significativamente das marcas e passaram a acompanhar suas ações diariamente. Portanto, é crucial que toda e qualquer iniciativa seja apresentada com transparência e coerência, reforçando a autenticidade e o compromisso da organização, evitando assim qualquer percepção negativa por parte do público.
Outro ponto que devemos levar em consideração é o funcionamento dos veículos de comunicação em um momento de crise. Nestes momentos, assim como nós, a imprensa está com todos os olhos voltados para a catástrofe e as suas vítimas, focada em noticiar o que está acontecendo, o que as pessoas mais precisam neste momento e quais são as melhores formas de ajudar, e não em destacar quais empresas são conscientes e estão fazendo doações. Menos ainda é o momento de utilizar a calamidade para vender produtos ou serviços. A pauta do momento deve ser o auxílio necessário e a situação das pessoas em um cenário de tragédia e devastação. Como sempre, a ordem é usar o bom senso.
Posteriormente, como parte do conjunto das pautas trabalhadas pelas companhias através de suas equipes ou agências de relações públicas, as ações e iniciativas de cunho social e ambiental podem – e devem – ser exploradas e divulgadas na imprensa. A divulgação periódica e cuidadosa dessas informações contribui, aí sim, para a construção da imagem das organizações, como um conjunto de obras trabalhadas.
Compete à área de comunicação social, particularmente à institucional, por meio das relações públicas, desenvolver atividades específicas à consecução dos objetivos de marketing social. E se for agir, ou seja, doar, envolver equipe ou promover uma ação, aja rápido. Assim como em uma crise da empresa, em uma crise social, quanto antes a ajuda chegar, melhor e mais envolvido na causa a marca ou empresa mostrará que está. Pare tudo e definida com todos os tomadores de decisão o que pode ser feito, como parar uma produção de um produto para fazer outro, por exemplo. Como uma grande marca fez. Ou desloque equipe para ajudar, equipamento, alimentação, logística. Sempre é possível ajudar e doar.
Trago essa reflexão para que as empresas entendam o que pode ser pauta em situações como essas e também para alertar que a função do profissional de relações públicas é identificar o timing certo para divulgar o trabalho e os objetivos sociais de uma organização. É bom ouvir esse profissional que conhece os trâmites e tem segue a cartilha de boas práticas de relacionamento com a imprensa. Em um cenário de consumidores e cidadãos cada vez mais exigentes e conscientes, essa função se torna mais desafiadora e necessária. Cabe a todos os responsáveis pela comunicação refletirem sobre o seu papel enquanto comunicadores e aconselharem empresas e entidades a divulgarem o seu papel social de forma responsável. Para as organizações, já passa da hora de se questionarem sobre o impacto que desejam ter no mundo e na sociedade e se querem, ou não, registrar em seu DNA, de forma real, a marca da responsabilidade social.
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