A indústria farmacêutica tem o essencial objetivo de produzir os medicamentos responsáveis pela manutenção da saúde de bilhões de pessoas ao redor do planeta. Sua indiscutível relevância é acompanhada por um dos mercados mais complexos e competitivos da atualidade, que utiliza como principal estratégia a promoção de seus produtos junto à classe médica, através dos profissionais conhecidos como propagandistas farmacêuticos.
A fim de motivar tais propagandistas, muitas empresas instituem um sistema de pagamento de premiações baseado não só nas visitas efetuadas à classe médica para mantê-los atualizados sobre as indicações terapêuticas dos medicamentos em sua região de atuação e nos canais de dispensação de determinada região (ou território).
Ocorre que, tal sistemática, tem impactado consideravelmente na Justiça do Trabalho, uma vez que diversas demandas trabalhistas movidas por propagandistas farmacêuticos, incluem o pedido de pagamento de diferenças das premiações recebidas. De modo geral, as alegações sustentam que o propagandista não teria tido acesso ao cálculo realizado para a averiguação de sua premiação, sendo comumente requerida a realização de perícia contábil para apuração dos valores devidos a este título.
O tema é bastante complexo, uma vez que cada empresa tem sua metodologia de cálculo das premiações. Entretanto, a dinâmica do cálculo da premiação dos propagandistas geralmente gira em torno das visitas médicas e demanda do medicamento propagado na região de atuação do propagandista.
Importante esclarecer aqui que o propagandista farmacêutico não realiza a venda direta dos medicamentos, haja vista que sua atuação se dá somente no âmbito da propaganda do produto aos médicos de uma determinada linha de tratamento, com intuito de ressaltar as vantagens e eficácia de seu remédio, para que estes passem a prescrevê-lo aos seus pacientes.
Uma vez receitado o referido medicamento, o paciente, via de regra, busca a farmácia/drogaria mais próxima para a aquisição do produto, cuja compra, de acordo com o plano de premiação de algumas farmacêuticas, fica registrada no sistema de venda de medicamentos e pode ser acompanhado pelo propagandista farmacêutico, em tempo real. É a partir daí que o propagandista, nestas industrias que possuem acesso a tal sistema, consegue acompanhar se a meta estipulada pela empresa está sendo atingida ou não.
No entanto, mesmo que algumas empresas disponibilizem o acesso ao sistema de vendas de medicamentos, a Justiça Trabalhista tem, via de regra, acolhido o recorrente pedido de pagamento de diferenças das premiações nas hipóteses em que a empresa acionada não apresenta a documentação completa acerca do programa de premiação, a qual possibilitaria a verificação do pagamento correto dos valores por ela instituídos.
Por outro lado, as chances de eventual improcedência do pedido de pagamento de diferença de premiação aumentam quando a empresa farmacêutica apresenta, de forma cronológica e organizada, as metas estipuladas aos empregados, com a indicação da porcentagem de vendas dos medicamentos por região, os documentos que demonstrem que o empregado tinha ciência acerca das metas e a demonstração da metodologia de cálculo, por meio do qual é possível apurar o valor recebido pelo empregado a este título.
A esse respeito, importante salientar que em algumas convenções coletivas de trabalho aplicadas aos empregados propagandistas farmacêuticos, foi acordado que as empresas deverão informar em regulamento próprio os parâmetros para o atingimento das metas e obtenção dos prêmios dos propagandistas, determinando a prévia divulgação dessas informações aos seus empregados.
Deste modo, diante da recorrente reincidência do pedido na esfera trabalhista, especialmente das diferenças de premiações, faz-se necessária a adoção de algumas medidas por parte dos empregadores farmacêuticos para mitigar o risco de condenação nesses casos.
A primeira recomendação é que a empresa tenha critérios claros e bem definidos acerca das metas a serem atingidas por seus empregados, sendo que tais informações devem constar de um regulamento específico para essa finalidade, bem como a disponibilização de relatórios trimestrais de produtividade e de apuração da premiação de forma individual para cada propagandista.
A segunda medida recomendada e que traz maior segurança jurídica às empresas farmacêuticas é a apresentação do relatório de apuração da premiação ao propagandista farmacêutico para ciência e conferência dos dados ali contidos, com sua respectiva assinatura para validação do prêmio a ser recebido naquele trimestre.
Demais disso, é imprescindível o treinamento dos gerentes ou superiores hierárquicos dos propagandistas farmacêuticos acerca do tema, para que estes possam explicar de forma clara os critérios para atingimento de metas e a sistemática do cálculo das premiações, além de disponibilizar aos propagandistas um canal direto para sanar dúvidas ou apontar irregularidades com relação a premiação recebida em determinado período.
Portanto, se a empresa farmacêutica tomar as cautelas acima sugeridas, o risco de uma condenação de pagamento de diferenças de premiações, no âmbito da Justiça do Trabalho torna-se remoto, eis que demonstrado que o empregado tinha conhecimento do meio de apuração, bem como que tinha possibilidade da conferência dos valores pagos sob este título.
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Luiz Fernando Alouche, sócio responsável pela área trabalhista do Iwrcf (lalouche@iwrcf.com.br – (11) 4550-5036)
Marianne Calil Jorge, advogada da área trabalhista do Iwrcf (mjorge@iwrcf.com.br – (11) 4550-5067) Gabriel Marchini Righetti, advogado da área trabalhista do Iwrcf (grighetti@iwrcf.com.br – (11) 4550-5060)
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