*Por Andrea Rios
Pela primeira vez na história, este ano teremos a Copa acontecendo no segundo semestre, junto com a Black Friday e o Natal. Estas datas são um incentivo para o consumo, com as já esperadas vendas de televisores (o torcedor tende a comprar uma novinha, para assistir os jogos em uma tela com melhor definição), de aparelhos eletrônicos e outros itens de desejo, com os descontos da chamada “sexta-feira de liquidações”, e os presentes para toda família no Natal. Mas como falar com esse novo consumidor que passou por tantas transformações profundas nos últimos dois anos de pandemia?
As pessoas passaram a comprar em uma jornada diferente e olham para as marcas sob um novo olhar: sustentabilidade, saúde e bem-estar. Muitos passaram a questionar seus hábitos, analisando a real necessidade de comprar itens novos. Houve uma revisão coletiva de valores, estilos de vida e objetivos. O estudo “Life Reimagined”, realizado pela Accenture, aponta que 50% dos consumidores dos EUA afirmam que a pandemia os fez repensar seu propósito pessoal e reavaliar o que é importante na vida deles.
Para atender a um público cada vez mais crítico e exigente, as empresas devem inovar em bens, serviços, experiências e investir em um marketing que abrace as mudanças. Os consumidores esperam que as marcas intensifiquem suas ações ambientais, refletindo isso nos produtos e serviços. Para se ter uma ideia, de acordo com levantamento da Forrester de 2021, 36% dos adultos online dos Estados Unidos preferem comprar de uma empresa/marca que tem preocupação com as mudanças climáticas, mesmo que o preço do produto seja mais alto. Por outro lado, muitos consumidores desejam agir em prol do meio ambiente, mas ficam frustrados pelo preço e/ou conveniência.
Esta preocupação ambiental se reflete no crescimento do reuso de produtos e na valorização da experiência sobre a propriedade. A sustentabilidade e a individualidade estão removendo o estigma associado às compras de segunda mão e impulsionando o comércio entre pessoas.
Outra tendência é que as pessoas valorizem cada vez mais a sua individualidade, com maior aceitação, autocuidado e inclusão. Elas estão em busca de amor próprio, priorizam a própria felicidade. Para conquistá-las, as marcas precisam criar conexões profundas, oferecendo produtos que evocam o bem-estar físico, emocional ou espiritual. A mensagem é trazer impacto positivo e melhorar a vida dos que buscam o amor próprio.
Em termos de tecnologia, as pessoas esperam que o metaverso traga melhorias para o seu dia a dia. Elas preferem o avanço em pontos de dor ao longo da jornada do que encantamento em pontos específicos. Estudos apontam que cerca de 60% dos adolescentes e adultos dos EUA acreditam que os ambientes virtuais tornarão o processo de encontrar treinos/rotinas fitness significativamente melhor, assim como as compras de imóveis. A tendência é que os ambientes imersivos impulsionem o comércio eletrônico e as vendas de produtos virtuais, à medida que o acesso se expandir. Pesquisa da InsiderIntelligence aponta que o mercado de fones de ouvido para realidade virtual cresceu 37% em 2021 e que é esperada uma taxa de crescimento ano a ano até 2026 de 24%.
Além disso, o consumidor vem se tornando cada vez mais criativo na solução de problemas, buscando alternativas. Mais de 50% dos consumidores se engajam em três ou até em cinco canais para fazer uma compra ou encontrar um serviço. Vale observar também que a mudança atingiu os públicos de maior faixa etária. Os consumidores mais velhos foram forçados a ficar online pela pandemia. Agora familiarizados e à vontade com a tecnologia, estão habilitados a fazer compras e a utilizar os serviços digitais. As empresas têm a oportunidade de adaptar sua experiência digital para atingir e atender às necessidades desse público.
Por outro lado, as coisas não são tão simples assim. Um estudo recente da American Marketing Association – AMA indica que oferecer um tratamento especial pode proporcionar satisfação momentânea, mas a maneira mais eficaz de satisfazer o cliente é simplesmente evitar decepcioná-lo ao longo da jornada. Infelizmente, muitas empresas ainda enxergam a experiência de maneira subjetiva, como algo que não pode ser definido e avaliado com precisão. Ledo engado. É possível sim saber o que agrada ou não o cliente, tanto que isso já é feito por meio de algoritmos e estatísticas há 20 anos. Já foram analisadas dezenas de indústrias para identificar os principais fatores de satisfação do consumidor.
Por incrível que possa parecer, os atributos mais satisfatórios para os clientes são normalmente itens sensoriais, que não são essenciais para o serviço ou produto contratado. Um bom exemplo são os chocolates ou “mimos” oferecidos por um hotel para os hóspedes. Tais itens não definem a qualidade da hospedagem, como conforto e limpeza dos quartos e banheiros, mas dão ao hóspede a sensação de que ele é valorizado. Já os atributos insatisfatórios são justamente os que são essenciais para a experiência do cliente, ou seja, os itens que são obrigatórios para aquele produto ou serviço.
Não cumprir com o básico do que se propõe tem um impacto muito maior na avaliação do consumidor sobre um produto ou serviço do que trazer pequenos benefícios. Fazer com excelência seu trabalho, sem decepções para o cliente, é a melhor forma de conquistá-lo. Dando um exemplo concreto para as datas comemorativas deste ano: para uma marca vale mais a pena oferecer um atendimento de excelência nas lojas, evitando filas nas unidades físicas e atrasos nas entregas do digital, do que oferecer brindes.
Encantar os clientes com desempenho acima da média em todos os atributos teoricamente levaria a uma satisfação muito maior do cliente. Este é o exemplo de marcas como a Disney no entretenimento e a Ritz-Carlton em hotelaria, que conseguem encantar seus consumidores de maneira infinita. O problema deste tipo de estratégia é que nem sempre ela é tangível. Para torná-la possível é necessário fazer investimentos contínuos. No entanto, as expectativas do público também irão crescer proporcionalmente. Com isso, a estratégia do “encantamento contínuo” se torna quase impraticável, podendo reduzir margens e trazer desafios diários. É mais vantajoso investir para eliminar problemas e atrito na experiência do cliente, cumprindo com tudo o que é indispensável para seu produto ou serviço, do que tentar emplacar novidades mirabolantes.
Os três eventos consecutivos deste segundo semestre trazem a oportunidade ideal para as empresas testarem as novas ferramentas, identificando quais aderem melhor aos seus propósito, produto e público. É a hora de saber o que os clientes realmente desejam em termos de experiência, tecnologia e propósito de marca.
*Andrea Rios é especialista em Omnichannel, fundadora da Orcas e professora no MBA Live da Fundação Getúlio Vargas. Com passagens por multinacionais como Unilever, Samsung e Motorola, criou o exclusivo Índice Omnichannel, para ajudar empresas dos mais variados tamanhos e segmentos a avaliar seu estágio na transição Omnichannel. Atualmente, oferece soluções para experiência do cliente que trazem crescimento e lucro para diferentes negócios. Entre elas estão marketing multifuncional, Omnichannel integrado com vendas, supply chain e tecnologia.
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