*Por Andrea Rios
Anualmente, acontece em janeiro a NRF – Retail’s Big Show, o maior evento de varejo do mundo, em Nova York. Na feira são apresentadas as principais tendências em tecnologia, gestão e negócios do varejo. A edição deste ano destacou, sob a perspectiva da liderança em tecnologia, os diferentes caminhos e possibilidades da transformação digital, a importância das métricas para avaliar a experiência omnichannel do cliente, ESG, e uma série de outros temas que estão definindo os ramos das empresas.
1 – A transformação das empresas é singular
Diferentes palestras e rodas de conversa destacaram que a transformação digital é variável. Não há um caminho único, mas sim um trajeto dinâmico e específico para a realidade de cada organização. O que é similar em todos os negócios é a necessária integração e gestão de dados, evitando redundâncias, mesmo quando os departamentos da empresa trabalham de forma independente. A boa governança de dados oferece às empresas uma plataforma para crescimento futuro.
Zulfi Dalal, diretor sênior de dados e análises da PVH Corp., uma das maiores organizações de moda no mundo, destacou em sua palestra que “Falhar em gerenciar dados é tão ruim quanto falhar em gerenciar capital. Os dados não podem ser geridos como capital porque evoluem, então precisam ser geridos como um ativo”.
John Furner, CEO da WalMart no EUA e Dr. James Cash, professor da Universidade de Harvard discutiram na palestra de abertura do evento, a importância de uma perspectiva de longo prazo, a perseverança e a tecnologia como aliada para tornar seus negócios mais resilientes e eficientes. Pesquisa da Microsoft feita com CEO’s mostrou que “95% dos executivos dizem que o cliente está evoluindo mais rápido do que eles podem mudar os seus negócios”.
2 – Omnichannel
Além disso, por mais que a omnicanalidade nas empresas já seja abordada há mais de cinco anos e em várias edições do evento, ela se mantém como uma das tendências discutidas. A diferença é que na NRF 2023 foram apresentados os cases de negócios que já estão observando e mensurando os resultados desta estratégia, como as varejistas Lowe’s, Target e Nordstrom.
O omnichannel deixou de ser uma opção para se tornar uma necessidade, não importando se a empresa é B2C (que vende para o consumidor final) ou B2B (que vende para outras empresas). Ele é obrigatório para qualquer negócio que deseje perdurar e atender o seu respectivo público.
Marvin Elison, o CEO da Lowe’s, uma das maiores redes de materiais de construção dos Estados Unidos, abordou em sua palestra a preocupação com o cliente que acessa os dois ambientes de negócios, presencial e o e-commerce, e como as empresas devem se preocupar em garantir o melhor atendimento nos dois ambientes, inclusive sincronizando serviços. Elison ainda destacou a importância de não haver ruído na jornada de busca do cliente pelo seu produto ou serviço.
Outro ponto de destaque desta NRF foi a experiência do colaborador; sem a qual as marcas não conseguem avanços na experiência para o cliente. Funcionários insatisfeitos com a empresa não conseguem vender bem para o consumidor final. Em uma economia em baixa, a CX é ainda mais importante para o sucesso de uma empresa. Para isso, é preciso considerar que um dos fatores que mais contribuem para uma má experiência do cliente é a má experiência do funcionário. Priorizar e avaliar a satisfação dos colaboradores levará a uma melhor CX o que, por sua vez, melhora os resultados da empresa. Outro ponto que deve ser cada vez mais valorizado é a importância de mensurar estes resultados.
3 – ESG
Diante da certeza de que os recursos naturais (energia, matérias primas, estabilidade de clima) não são infinitos, o ESG abraçou o tema do “resale” (re-venda ou venda de usados), sendo este um dos hot topics do evento de 2023.
Durante a NRF, a Euromonitor divulgou resultado de estudo que revela que “45% dos profissionais do varejo disseram que investir em iniciativas de sustentabilidade é uma prioridade estratégica para sua empresa nos próximos cinco anos.” (Euromonitor, NRF 2023).
A futurista Kate Ancketill da GDR Creative Intelligence reforçou a finitude dos recursos e a necessária adaptação das empresas à essa nova era. Três tendências para mitigar esta limitação foram mostradas:
1. Power shits – Estruturar cadeias de supply chain descentralizadas, gerando flexibilidade, otimização de recursos, e, quando possível, viabilizar que os consumidores usufruam dessas estruturas para conseguir formas alternativas de complementar a renda;
2. Inclusive Regeneration – Não adianta as empresas “fazerem de conta” que os recursos são infinitos. A economia circular está aí para entrar na vida das marcas de forma decisiva. Conserto de equipamentos e reuso de roupas são alguns exemplos de estratégias que as marcas terão que adotar.
3. Dopamine Economy – Trazida pela necessidade (vício mesmo) de sermos recompensados instantaneamente com likes. Isso está gerando ambientes onde a experiência é o suporte que ajuda consumidores a “florescerem” em tempos complexos e desafiadores.
Varejistas estão apostando em diferentes modelos de negócios de revenda de produtos como parte de suas ações voltadas para a sustentabilidade. Seja implementando itens usados como parte dos seus portfólios online e lojas, via marketplaces como a Amazon, ou com o apoio de plataformas especializadas em revenda.
Mais consumidores estão interessados em comprar produtos e peças usadas na busca por economia, qualidade, redução do impacto ambiental do seu consumo ou até mesmo para fazer a primeira compra de um produto de luxo. Independente do motivo, a revenda de itens de segunda mão é uma tendência entre consumidores de diferentes idades e perfis sociais.
Os dados também são fundamentais para a sustentabilidade. É importante medir o impacto do stack de tecnologia da empresa, incluindo parceiros e fornecedores externos. Isso requer solicitar, extrair e reconciliar dados entre partes externas – e lembrar de agregar mais do que apenas dados de descarbonização. Todos estes fatores são levados em consideração pelos consumidores, que exigem cada vez mais ter relacionamento e consumir de marcas e negócios com responsabilidade socioambiental.
Os funcionários também precisam fazer parte de uma estratégia ambiental. Eles podem ser orientados a fazer boas escolhas de sustentabilidade. De acordo com a empresa de tecnologia Cisco, por exemplo, existem 27,1 bilhões de dispositivos conectados à internet – ou seja, mais de três dispositivos para cada pessoa no planeta. Muitos funcionários corporativos carregam dois telefones celulares, embora não precisem. A tecnologia existente permite que eles segmentem dois ambientes diferentes em um único dispositivo.
4 – Tecnologia: cybersegurança, mensuração de dados e inteligência artificial
A tecnologia não é a solução para todos os problemas, mas, quando bem aplicada, eleva o capital humano das empresas e o seu papel na criação de valor para a economia. Embora ferramentas facilitem e agilizem a adoção de tecnologias digitais em negócios tradicionais, as pessoas não serão substituídas pela tecnologia tão cedo. O humano segue sendo essencial para uma experiência de qualidade, sendo valorizado pelos consumidores.
No entanto, sabemos que a tecnologia é essencial para o crescimento e manutenção dos negócios, especialmente em um cenário de crise econômica global. Cada passo em direção à transformação digital gera ganhos reais e, no mercado recessivo que definirá 2023, esses ganhos são multiplicadores de força para a saúde da organização como um todo.
As duas maiores tendências em tecnologias para 2023 são a inteligência artificial e a cibersegurança nas empresas. IA passou de um conceito interessante para uma tecnologia necessária no varejo. Os desafios duplos da incerteza econômica e da busca de talentos obrigam empresas a trabalharem de maneira mais inteligente, e não mais difícil. Varejistas americanos já passaram de testes esporádicos de IA para implementarem soluções de longo prazo que auxiliam na produtividade das equipes internas e melhoram a experiência para o cliente. Casos mais comuns estão em visão computacional, atendimento ao cliente, limpeza de dados, recrutamento e integração de RH. A estratégia e avanços com digital twins também tem apresentado resultados surpreendentes. Esse tema, por exemplo, foi debatido na palestra: “Gêmeos digitais: revelando a nova superpotência do mundo do varejo produzida pela Dell”.
A edição deste ano da NRF 2023 reforçou conceitos que já estão em voga e que devem, cada vez mais, fazer parte do dia a dia das empresas, ao invés de inserir no debate temas novos. O omnichannel, o ESG e a transformação digital não são novidades, mas muitos negócios sentem dificuldade para aplicar estes conceitos e mudar seus modelos de gestão, adaptando-se às mudanças no perfil dos consumidores. O debate, sem dúvida, é essencial.
*Andrea Rios é especialista em Omnichannel, fundadora da Orcas e professora no MBA Live da Fundação Getúlio Vargas. Com passagens por multinacionais como Unilever, Samsung e Motorola, criou o exclusivo Índice Omnichannel, para ajudar empresas dos mais variados tamanhos e segmentos a avaliar seu estágio na transição Omnichannel. Atualmente, oferece soluções para experiência do cliente que trazem crescimento e lucro para diferentes negócios. Entre elas estão marketing multifuncional, Omnichannel integrado com vendas, supply chain e tecnologia.
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